Pass-through cambial: quanto do dólar chega ao seu preço final

Como medir e gerir o repasse do câmbio ao seu preço e à sua margem — com hedge por janelas, bandas contratuais e governança de preços.

Oct 23, 2025 - 09:18
Oct 23, 2025 - 19:13
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Pass-through cambial: quanto do dólar chega ao seu preço final

Pass-through cambial: quanto do dólar chega ao seu preço final

Tempo de leitura: 12 min 

Resumo executivo: do câmbio ao preço — a ponte que define sua margem

Quando o dólar mexe, sua margem balança. O pass-through cambial é a proporção da variação do câmbio que chega ao seu preço final (e/ou aos seus custos) após um certo tempo. Não é constante: depende de setor, concorrência, estoques, contratos e da sua própria governança de preços. Este guia explica como o repasse funciona, como medir no seu negócio e quais alavancas — hedge, bandas contratuais e “buckets” de cobertura — reduzem a volatilidade de margem.

O que é pass-through (sem economês)

Pass-through cambial é a fração (0 a 100%) da desvalorização/apreciação do real que aparece no seu preço ou custo ao longo do tempo. Ex.: se o dólar sobe 10% e seu preço médio sobe 4% em três meses, o pass-through de 90 dias é ~40%. Há três janelas que importam:

  • Curto prazo (0–30 dias): impacto imediato em itens sem estoque ou com preço indexado (combustíveis, certos insumos importados, frete internacional).
  • Médio prazo (30–90 dias): quando estoques de segurança acabam, pedidos de reposição chegam e cláusulas de reajuste são acionadas.
  • Longo prazo (90–360+ dias): renegociação de contratos, revisão de tabelas, adaptações de mix e produtividade.

Hint: pass-through baixo não significa “bom” por si só. Se você não consegue repassar, seu custo explode e a margem encolhe. A gestão ideal é previsível: repassar com critério, comunicar e proteger com hedge o que não dá para repassar no tempo certo.

Quem repassa mais (e quem repassa menos)

Setores de pass-through alto

  • Combustíveis e químicos: dólar pesa no input e no frete; repasses tendem a ser rápidos (bandas + defasagens curtas).
  • Eletrônicos e bens importados: cadeia dolarizada; baixa substituição local; estoques amortecem no curtíssimo prazo, mas a reposição repassa.
  • Proteínas e agroexportadores: preço em dólar guia a formação do preço interno.

Setores de pass-through moderado/baixo

  • Varejo de bens não duráveis: concorrência intensa reduz repasse imediato; governança de promoções define o “quanto” e o “quando”.
  • Serviços locais: mão de obra e aluguel em BRL reduzem sensibilidade direta (indireta via energia/combustíveis).
  • Construção: impactos via aço/cimento/commodities e câmbio em importados, com repasse faseado pelo cronograma de obras e contratos.

Os 7 motores do pass-through na sua empresa

  1. Participação de importados no custo (direta e indireta, ex.: embalagens, aditivos, licenças).
  2. Janela de estoques e lead time de reposição (quanto mais longo, mais tarde o repasse aparece).
  3. Concorrência e poder de marca (pricing power eleva previsibilidade de repasse sem destruir volume).
  4. Contratos e bandas (reajuste automático por câmbio/diesel/IPCA com defasagens e caps/floors).
  5. Elasticidade da demanda por canal/produto (repassar onde dói menos).
  6. Hedge e indexadores (NDF/termo/opções/ swap e dívida IPCA+/CDI casada ao fluxo).
  7. Calendário de reajustes e governança (comitê de preços, gatilhos e comunicação).

Como medir o pass-through no seu negócio (passo a passo)

  1. Mapeie os custos dolarizados (com nota fiscal/DI): % do CMV ligado ao USD (direto + indireto).
  2. Separe por família de produtos e canal (atacado, varejo, e-commerce, export): pass-through raramente é igual para tudo.
  3. Crie janelas de 30/90/180 dias e calcule a variação do preço médio vs. variação do USD (ou USD-PTAX/índice de custo relevante) nessas janelas.
  4. Ajuste por mix e promoções: use preço líquido comparável (P&L gerencial) para não confundir mudança de mix com repasse.
  5. Estime elasticidades simples: quanto volume caiu com repasses passados? Onde o cliente aceitou melhor?
  6. Monte um “corredor de repasse”: quanto precisa repassar para manter margem-alvo por família/canal, em cada janela.
  7. Valide com o comercial e compras: turnos, concorrentes, alternativas de fornecedores.

No mês seguinte, compare planejado vs. realizado. A ideia é aprender por iteração até que o seu pass-through fique previsível.

Ferramentas para reduzir o vaivém: hedge, contratos e buckets

Hedge cambial que casa com o calendário

Se o dólar pressiona seus custos, proteja o que não dá para repassar no tempo certo. Ex.: NDF/termo para 30–90 dias “cobrem” pedidos firmes, enquanto opções (colares) em 180–360 criam um teto com algum upside caso o dólar recue. Swaps ajudam quando a dor é de indexador do passivo (CDI↔USD).

▶ Simular perda marginal e montar hedge por janelas (30/90/180/360)

Contratos com bandas e cestas de índices

Negocie bandas de câmbio/combustíveis e cestas (USD + diesel + IPCA) com defasagem explícita. Isso reduz discussão e acelera repasse quando o choque vem, além de proteger seu fornecedor (menos risco → melhor preço).

Governança de preços

Crie um comitê quinzenal com compras, comercial, finanças e logística: verifique USD/custos por família, ative gatilhos de repasse (ex.: USD 3% acima do orçamento → reajuste programado em X% no canal Y) e monitore NPS/churn para não queimar marca.

Exemplos práticos (sem bola de cristal)

Indústria de autocuidado

Diagnóstico: 45% do CMV dolarizado (insumos + embalagens). Ação: NDF escalonado 30/60/90 para pedidos firmes; colar 180 com teto para proteger orçamento; contratos com fornecedores atrelados a USD+diesel com defasagem de 30 dias; governança de preços por canal. Resultado: margem dentro do corredor mesmo com USD +8% em 60 dias; queda pequena de volume graças a segmentação por elasticidade.

Distribuidor de tecnologia

Diagnóstico: estoque de 50 dias; concorrência forte. Ação: repasses parciais faseados; reforço de mix (SKUs “farol” seguram preço; margem vem dos complementares); NDF 30/60 para reposição; renegociação de prazos com fabricantes. Resultado: erosão de margem limitada e giro preservado.

Exportador de proteína

Diagnóstico: receita ligada ao USD; custos em BRL/commodities. Ação: venda de USD (NDF) 30/90; ACC para suavizar caixa; colar 180 para garantir piso de BRL por tonelada; compras de insumos com bandas. Resultado: previsibilidade do fluxo em BRL e menor variância de margem.

Erros comuns (e como fugir deles)

  • Jogar tudo no preço “do dia”: repasse por impulso derruba volume. Prefira corredores e gatilhos.
  • Hedge tardio: proteção comprada após o pico é cara. Defina política por buckets com metas mínimas.
  • Contratos fracos: sem bandas, cada reajuste vira briga. Padronize índices e defasagens.
  • Um número só para a empresa toda: pass-through varia por família e canal; segmente.
  • Esquecer impostos e logística: câmbio impacta frete e tributos sobre importação; inclua na conta.

Checklist rápido para a próxima reunião de preços

  1. Quanto do CMV é dolarizado direto/indireto?
  2. Qual o pass-through observado em 30/90 dias por família/canal?
  3. Quais gatilhos de repasse estão ativos nesta quinzena?
  4. Qual a cobertura de hedge por bucket (30/90/180/360) vs. meta?
  5. Há contratos a renegociar com bandas/cestas? Em quais datas?

🌎 Simular FX Loan (USD) vs. BRL com hedge integrado💠 Comparar CET por indexador (CDI × IPCA+ × USD)

FAQ (perguntas frequentes)

Pass-through é simétrico para alta e queda do dólar?

Nem sempre. Em mercados com competição forte, o repasse na alta costuma ser mais rápido que o “desrepassar” na queda. A governança (bandas e calendários) reduz assimetria.

O que é melhor: segurar preço ou volume?

Depende da elasticidade. O ideal é segmentar: proteger margens nos SKUs com menor elasticidade e usar “faróis de preço” para preservar tráfego/giro.

Opções não são caras?

Pagam-se para comprar teto/piso. Em ambientes voláteis, essa assimetria vale por reduzir CFaR e risco de estourar covenants. Estruturas “colar” podem reduzir o custo do prêmio.

Conclusão: pass-through previsível vale mais que preço “bonito”

Seu cliente aceita repasses quando você comunica com clareza e entrega valor. Seu P&L agradece quando você mede o pass-through por família/canal, protege os gaps com hedge e assina contratos com bandas e cestas de índices. Em 2026, a vantagem competitiva não é “acertar o dólar”, e sim prever a margem — e operar com disciplina.

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Vinicius Teixeira Vinicius Teixeira é especialista com mais de 15 anos de experiência no mercado financeiro, atuando com foco em soluções estratégicas para câmbio, crédito estruturado e inteligência financeira para empresas. Ao longo da carreira, ajudou centenas de negócios a tomarem decisões mais inteligentes e rentáveis, sempre com uma abordagem analítica, consultiva e baseada em dados. Fundador da GX Capital, Vinicius combina sua vivência de mercado com o uso de tecnologias avançadas e inteligência artificial para oferecer uma nova geração de serviços financeiros. É também palestrante, tendo participado de eventos e formações voltadas à educação financeira e à transformação digital no setor. No portal da GX Capital, compartilha sua visão sobre o futuro do mercado, tendências econômicas e estratégias práticas para empresas que querem crescer com eficiência e segurança.