Selic, CDI e IPCA — o que muda para janeiro (guia prático para tesourarias)

Como o trio Selic–CDI–IPCA influencia caixa, dívida, preço e CAPEX no início do ano.

Dec 25, 2025 - 18:04
Dec 24, 2025 - 19:00
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Selic, CDI e IPCA — o que muda para janeiro (guia prático para tesourarias)

Selic, CDI e IPCA: o que muda para janeiro

Resumo executivo

Janeiro é o mês da virada de contratos, orçamentos e metas. Três siglas mandam no jogo: Selic (a taxa básica definida pelo Copom), CDI (a taxa efetiva do mercado interbancário, normalmente muito próxima da Selic) e IPCA (a inflação oficial ao consumidor). A combinação entre essas variáveis define: (1) o rendimento do cash e das aplicações de curtíssimo prazo; (2) o custo do capital de giro e do financiamento de projetos; (3) a política de preço e as cláusulas de reajuste; (4) a competitividade entre CDI+, IPCA+ e prefixado no caixa e na dívida. Este guia organiza o que muda na prática para o início do ano, com um playbook de 30–90 dias para tesourarias, CFOs e investidores, KPIs para o comitê e armadilhas a evitar. Fechamos com CTAs para simular CET, comparar funding (BNDES/mercado) e calibrar hedge cambial.

Selic, CDI e IPCA — como as peças se encaixam

Selic é a taxa-alvo da política monetária. Quando sobe, o objetivo é esfriar a demanda e ancorar expectativas de inflação; quando cai, é para estimular crédito e investimento. CDI é a materialização do custo do dinheiro overnight entre bancos; para efeitos práticos, remunera o caixa diário e indexa boa parte do crédito corporativo. IPCA mede o poder de compra — e, portanto, o juro real é a diferença entre o retorno nominal e a inflação esperada.

Para janeiro, três perguntas guiam decisões:

  1. Qual é o juro real ex-ante? Compare CDI/DI futuro com a inflação esperada para 12 meses. Isso indica a atratividade de manter caixa em CDI+ versus travar IPCA+ ou prefixado.
  2. Qual a inclinação da curva? Se o mercado precifica cortes (curva longa fechando), travar prefixado/real pode capturar prêmio. Se a curva abre, escadas curtas e flexibilidade valem mais.
  3. Qual é a dinâmica do IPCA (núcleos, serviços, bens monitorados)? Isto orienta reajustes de contratos, gatilhos de repasse e mix de indexadores na dívida.

O que muda na prática — caixa, dívida, preço e CAPEX

Caixa e aplicações

  • Remuneração do D+0/D+1: com CDI elevado, manter envelopes operacionais em pós-fixados líquidos continua eficiente. Ganhos adicionais vêm de varredura automática e contas por finalidade para evitar “dinheiro parado”.
  • Escada tática IPCA+: se a curva real oferecer prêmio, faça uma escada 6–36 meses proporcional ao calendário de uso do caixa estratégico.
  • Prefixado: ganha atratividade quando há perspectiva crível de queda de juros. Se o cenário é incerto, prefira escadas curtas e diversificação de indexadores.

Dívida e crédito

  • CDI+ vs. IPCA+ vs. prefixado: compare por CET e flexibilidade (carência, amortização, covenants). Em fases de CDI alto e inflação domada, CDI+ pode ser competitivo no curto; se a curva indica queda, prefixar parte pode blindar orçamento.
  • BNDES/TLP: janeiro costuma reabrir agendas; avalie giros elegíveis e projetos de eficiência (energia, digital) com prazos e carências melhores que mercado.
  • Mercado de capitais (debêntures/NP/LC): se o crédito corporativo estiver seletivo, prepare RFP, rating e documentação para pular na janela quando spreads fecharem.

Preço e reajuste

  • Indexação: revisar contratos que usam IPCA/IGP e prazos de reajuste. Em janeiro, muitos acordos viram o índice base; reduza defasagens que corroem margem.
  • Política comercial: alinhe descontos à economia de CET (PIX, à vista, antecipado) e não a “metas genéricas”. Desconto bom é o que paga a conta de capital de giro.

CAPEX e TIR

  • WACC atualizado: recalcule TIR de projetos com Selic/CDI e IPCA de base para 2026. Priorizam-se projetos que reduzem custo estrutural (energia/logística) e geram recorrência de caixa.

Quando escolher CDI+, IPCA+ ou prefixado

CDI+: escolha natural para liquidez e horizonte incerto; ideal para caixas operacionais e dívidas com amortização variável. Risco: se o ciclo virar rápido, o custo cai, mas você perde a chance de travar barato.

IPCA+: protege poder de compra do caixa e dá visibilidade ao serviço da dívida real. Faz sentido em escadas casadas ao uso planejado e quando o juro real implícito está atraente.

Prefixado: melhor em ambiente de queda de juros adiante e inflação estável. Para dívida, evita “surpresas” de fluxo; para caixa, exige disciplina de horizonte (não iliquide o que é de curto prazo).

Mapeando contratos e “reset” de janeiro

Faça um mutirão de 48–72 horas para listar contratos que viram índice ou renovam em janeiro: aluguel, serviços recorrentes, logística, SaaS, PPAs, manutenção, seguros e financiamentos. Aplique três etiquetas:

  • Índice e base (IPCA, IGP, SELIC, câmbio) e janela de reajuste (mês-base).
  • Repasse permitido (cláusulas, esteiras de aprovação comercial).
  • Sensibilidade (alto impacto em margem/caixa).

Com o mapa, renegocie prioridades: reduza defasagens, troque indexador quando fizer sentido, e proponha gatilhos de reequilíbrio quando insumos-chave explodirem.

KPIs para monitorar em janeiro

  • Juro real ex-ante (DI 12m – IPCA esperado).
  • Prêmio real contratado em IPCA+ e duration média do caixa.
  • CET médio do giro e do alongamento (bancos/mercado/BNDES).
  • Mix de indexadores na dívida (CDI/IPCA/prefixado/USD) e muro de vencimentos.
  • Defasagem de reajuste (dias) entre contratos de compra e venda.
  • Base de hedge (spot x PTAX) e MtB (desvio do câmbio orçado) se houver exposição em USD.

Armadilhas de virada (e como desarmar)

  • Alongar por impulso: travar prefixado IPCA+ sem ler a curva. Antídoto: simular cenários (±100 bps) e usar escadas.
  • Caixa parado: perder rendimento por não varrer D+0. Antídoto: cash pooling e contas por finalidade.
  • Indexador desalinhado: comprar por IPCA e vender por preço fixo. Antídoto: cláusulas de repasse e calendários de reajuste alinhados.
  • Esquecer o IPCA “dos serviços”: inflação de serviços é teimosa; não subestime o impacto no OPEX. Antídoto: renegociações trimestrais ou semestrais.
  • Concentrar vencimentos em uma única data. Antídoto: buckets 30/60/90/180/360 para spreads de risco.

Exemplos ilustrativos (hipotéticos)

Indústria com insumos dolarizados

Contexto: custos em USD, vendas em BRL com repasse parcial. Ação: dívida CDI+ no curto; swap parcial CDI→USD para alinhar DSCR; NDF por lote de importação; revisão trimestral de preço por IPCA + câmbio. Resultado: menor volatilidade de margem.

Varejo omnichannel

Contexto: DSO alto no cartão e pico de caixa em janeiro. Ação: descontos no PIX baseados em economia de CET; antecipação seletiva com teto; caixa D+0 em CDI+; renegociação de aluguel indexado a IPCA com cap. Resultado: giro mais rápido e custo de capital menor.

Serviços (SaaS)

Contexto: OPEX em cloud (USD) e receita em BRL. Ação: NDF mensal para 70% do consumo; cláusula semestral de reajuste por IPCA+câmbio; caixa estratégico em IPCA+ curto. Resultado: previsibilidade de OPEX.

Playbook de 30–90 dias (operacional e conselho)

  1. Hoje–D+7: atualizar premissas de orçamento (Selic/CDI/IPCA), revisar política de caixa (contas por finalidade, varredura D+0) e inventariar contratos que reajustam em janeiro.
  2. D+7–D+15: rodar RFP de giro (bancos, FIDC) e comparar por CET; montar escada IPCA+/prefixado conforme janela; definir mix dívida (CDI/IPCA/prefixado).
  3. D+15–D+30: renegociar contratos críticos (índice, defasagem, gatilhos); revisar pricing e política de desconto por economia de CET; se houver exposição cambial, criar buckets 30/60/90.
  4. D+30–D+60: avaliar linhas BNDES/TLP e preparar documentação de mercado (rating, auditoria, covenants) para eventual janela.
  5. D+60–D+90: post-mortem de Q1: juro real contratado, CET efetivo, defasagem de reajustes, MtB cambial, KPIs de liquidez. Ajustar metas e alçadas.

💠 Aurum — comparar CET (CDI+, IPCA+, prefixado) 🏛️ Linhas BNDES — prazos, carência e custo 📊 Mercado de Capitais — debêntures/NP/LC 🌎 Risco Cambial — perda marginal por buckets

FAQ — dúvidas rápidas

CDI e Selic são a mesma coisa?

Não. A Selic é a meta definida pelo Copom; o CDI é a taxa efetiva do mercado interbancário. Na prática, se movem muito juntos — e o CDI é o que remunera boa parte do caixa e indexa muitos contratos.

Com IPCA em desaceleração, devo migrar tudo para prefixado?

Não necessariamente. Prefira escadas e combine indexadores. Prefixar parte reduz incerteza, mas exige convicção sobre a trajetória de juros; IPCA+ protege poder de compra; CDI dá flexibilidade.

Como ajustar contratos em janeiro?

Revise o índice, a base (mês de referência) e a defasagem. Negocie gatilhos e cap/floor quando fizer sentido para evitar “surpresas” ao longo do ano.

Quando faz sentido BNDES/TLP?

Para giros elegíveis e projetos com prazo longo, carência e custo estável. Planeje com antecedência: documentação e compliance são parte do CET.

Tenho receita/custo em USD. Onde entram Selic/CDI/IPCA?

Entram na avaliação do custo de oportunidade em BRL e no mix de dívida. Para o câmbio, use NDF/termo/opções por buckets e alinhe a base (spot/PTAX) com o pricing.

Conclusão

Janeiro não é a hora de “adivinhar” juros ou inflação; é a hora de operar processo: caixa líquido e produtivo, dívida comparada por CET, contratos com indexação coerente e escadas que reduzem arrependimentos. Com KPIs e playbook, o trio Selic–CDI–IPCA vira parâmetro — não susto.

Conteúdo educativo; exemplos são ilustrativos e não constituem recomendação financeira, jurídica, contábil ou de investimentos.

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Vinicius Teixeira Vinicius Teixeira é especialista com mais de 15 anos de experiência no mercado financeiro, atuando com foco em soluções estratégicas para câmbio, crédito estruturado e inteligência financeira para empresas. Ao longo da carreira, ajudou centenas de negócios a tomarem decisões mais inteligentes e rentáveis, sempre com uma abordagem analítica, consultiva e baseada em dados. Fundador da GX Capital, Vinicius combina sua vivência de mercado com o uso de tecnologias avançadas e inteligência artificial para oferecer uma nova geração de serviços financeiros. É também palestrante, tendo participado de eventos e formações voltadas à educação financeira e à transformação digital no setor. No portal da GX Capital, compartilha sua visão sobre o futuro do mercado, tendências econômicas e estratégias práticas para empresas que querem crescer com eficiência e segurança.