SELIC vs. CDI vs. IPCA: quando cada um deles manda no seu custo de capital

Guia prático para escolher entre CDI, IPCA+ e prefixado, casar prazos e reduzir CET em 2026 — com simuladores para comparar operações.

Oct 21, 2025 - 14:01
Oct 22, 2025 - 17:36
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SELIC vs. CDI vs. IPCA: quando cada um deles manda no seu custo de capital

SELIC vs. CDI vs. IPCA: quando cada um manda no seu custo de capital

Tempo de leitura: 18 min 

Resumo executivo: por que três siglas mexem tanto com o seu DRE

No Brasil, quase todas as decisões financeiras orbitam três referências: SELIC (a taxa básica definida pelo COPOM), CDI (o custo efetivo do dinheiro entre instituições financeiras) e IPCA (a inflação oficial). Elas se cruzam em empréstimos, aplicações, debêntures, contratos com fornecedores, reajustes comerciais e valuation. Na prática, cada uma “manda” em momentos diferentes: a SELIC é o ponto de partida da curva de juros; o CDI é o benchmark de curtíssimo prazo e do crédito pós-fixado; e o IPCA traduz o poder de compra e indexa contratos de longo prazo. Saber qual índice domina cada decisão evita erros caros de precificação, hedge e funding.

O tripé em 5 minutos: definições sem jargão

SELIC

É a taxa básica de juros da economia. Orienta a remuneração dos títulos públicos federais de curtíssimo prazo e, por tabela, a curva de juros inteira. Quando o COPOM corta ou eleva a SELIC, todo o resto — CDI, custo de captações bancárias e prêmios de risco — se reposiciona.

CDI

É a taxa média das operações interfinanceiras de um dia. Na prática, tornou-se o índice de referência de quase todo pós-fixado privado (CDB, LCI/LCA, fundos DI, linhas de capital de giro atreladas a % do CDI, etc.). Em condições normais, CDI ≈ SELIC, mas há diferenças técnicas e pontuais.

IPCA

Índice de preços ao consumidor amplo, medindo inflação. Em dívidas e investimentos prefixados ou indexados à inflação, o IPCA aparece como indexador: geralmente “IPCA + spread” em títulos e financiamentos de prazos longos.

Quem manda no CET? Regras simples que evitam armadilhas

O Custo Efetivo Total (CET) é o que de fato sai do seu caixa, incluindo juros, taxas, seguros e IOF. Para saber qual índice pesa mais no CET, observe:

  1. Prazo: quanto mais longo, maior a probabilidade de IPCA dominar (ou o risco de você errar a inflação futura); no curtíssimo prazo, CDI dita o ritmo.
  2. Nível de competição/crédito: em empresas com bom risco e track record, o spread sobre CDI cai; em projetos estruturados, IPCA + spread é comum.
  3. Regra de formatura: se a receita é reajustada por inflação, passar dívida para IPCA costuma alinhar melhor fluxo.
  4. Exposição cambial/insumos: se seus custos são sensíveis ao dólar e ao petróleo, a volatilidade do IPCA pode aumentar (combustíveis, fretes), exigindo bandas de repasse e/ou hedge.

Mapa mental: seleção de indexador por situação

Capital de giro rotativo (3–18 meses)

  • Melhor referência: CDI pós-fixado (% do CDI) com spread competitivo.
  • Por quê: caixa gira rápido; a visibilidade da inflação no curto prazo é baixa como diferencial; CDI é a régua do custo de oportunidade bancário.
  • Cuidado: alongar giro em CDI com spread alto e sem amortização escalonada é convite a rolagem cara.

CAPEX de ciclo médio (2–5 anos) com receita reajustada por inflação

  • Melhor referência: IPCA + spread, com carência e amortização casadas ao ramp-up.
  • Por quê: casa dívida com reajuste de preço do seu contrato; protege margem real.
  • Cuidado: IPCA volátil com spread alto pode superar CDI. Simule curvas realistas.

Projetos de longo prazo (5–15 anos): infraestrutura, imobiliário, energia

  • Melhor referência: IPCA + spread (debêntures incentivadas, project finance) ou mix IPCA/CDI para diversificar riscos.
  • Por quê: a inflação ao longo do ciclo é o risco principal; contratos costumam ter real terms.
  • Cuidado: choque inflacionário temporário pode inflar prestações. Preveja escadas de amortização.

Estoque financeiro/tesouraria de curto prazo

  • Melhor referência: CDI (fundos DI, compromissadas, CDBs de liquidez).
  • Por quê: objetivo é preservar liquidez e acompanhar o custo de oportunidade.
  • Cuidado: não trave em prefixado longo em véspera de virada de ciclo.

Prefixado: quando faz sentido “travar” a taxa

Taxas prefixadas são úteis quando você tem visão convicta de queda de juros ou precisa de previsibilidade extrema. Em ambientes de desinflação, prefixar parte da dívida reduz CET prospectivo. Porém, prefixado carrega risco de base: se a inflação surpreende para cima, seu preço real cai; se os juros sobem, seu custo relativo piora. Por isso, o manual do CFO sugere portfólios híbridos: uma fração CDI, uma fração IPCA e, conforme o ciclo, um “bloco” prefixado.

Como cada índice entra na formação de preços e contratos

Compras e logística

Fretes, aço, energia e químicos reagem a choques de commodities e câmbio. Esses choques passam pelo IPCA com defasagem, mas o seu fornecedor pode indexar por ICAs setoriais ou por bandas de reajuste trimestrais. Em contratos críticos, usar cestas de índices (IPCA, diesel ANP, câmbio) com caps/floors evita brigas e protege margem.

Receita

Planos de assinatura, locações, pedágios, fornecimentos industriais e contratos de serviços usam IPCA como indexador padrão. A tesouraria deve assegurar que as dívidas acompanhem a mesma lógica para evitar descasamento real.

Salários

A folha responde a convenções e a mercado de trabalho. A inflação pressiona salários, mas ajustes são discretos (anuais). Em ciclos de inflação alta, mesmo dívidas CDI podem ficar mais baratas em termos reais se os repasses de preço funcionarem.

Curva de juros, prêmio de risco e o seu WACC

O WACC combina custo da dívida (pós impostos) com custo do capital próprio. SELIC/CURVA determinam o piso do custo de dívida; IPCA altera a taxa real; o prêmio de risco (país, setor, crédito) acrescenta o resto. Em mercados voláteis, duas empresas do mesmo setor podem ter WACCs muito diferentes apenas por governança, alavancagem e qualidade de garantias. Resultado: a escolha SELIC/CDI/IPCA em cada instrumento não é neutra — ela altera o WACC e a fronteira de investimento.

Checklist de decisão: qual indexador escolher agora

  1. Fluxo de caixa da operação/projeto tem reajuste por IPCA? Se sim, priorize dívida IPCA.
  2. Prazo inferior a 18 meses? CDI tende a ser o índice “natural”.
  3. Convicção macro de queda de juros nos próximos 12–24 meses? Considere prefixado parcial.
  4. Volatilidade de custos alta e repasse incerto? Evite concentração em IPCA; use mix + cláusulas de reajuste de receita.
  5. Governança e rating interno permitem spreads competitivos? Negocie CDI% agressivo ou IPCA+ menor.

Simulações que todo CFO deveria rodar

1) Giro vs. CDI

Varie CDI em ±200 bps e observe efeito no CET de linhas de capital de giro. Compare com antecipação de recebíveis (FIDC) e com emissão curta no mercado.

2) IPCA choque

Projete IPCA base/alto/baixo e simule dívida IPCA+ em cada cenário. Verifique sensibilidade do serviço da dívida e a cobertura via reajuste de receita.

3) Prefixado parcial

Crie três carteiras de dívida: (A) 70% CDI | 30% IPCA+; (B) 50% CDI | 30% IPCA+ | 20% prefixado; (C) 30% CDI | 50% IPCA+ | 20% prefixado. Compare CET e volatilidade do serviço da dívida.

💠 Calcular CET e comparar CDI, IPCA+ e prefixado (Aurum)

📊 Simular emissão no mercado de capitais (debêntures/NP/LC)

Erros comuns — e como evitá-los

  • Escolher indexador pela “moda”: CDI fica popular quando a taxa cai; IPCA vira estrela em períodos de desinflação. Decida a partir do fluxo e do prazo.
  • Comparar taxas “no seco”: IPCA+5% pode parecer caro vs. CDI+1,5% — até você colocar o IPCA projetado na conta e adicionar IOF/tarifas.
  • Concentrar demais: carteira 100% CDI ou 100% IPCA aumenta risco. Busque diversificação.
  • Ignorar defasagens contratuais: receita reajustada anual x dívida com correção mensal pode gerar mismatch de caixa. Inclua reserva e escada de amortização.
  • Não usar hedge quando há exposição a câmbio/commodities que contaminam IPCA e repasses.

Setor por setor: como o índice “certo” muda

Infraestrutura e utilidades

Receita regulada e contratos com indexação clara a IPCA/IGP. Dívidas IPCA+ fazem mais sentido, com duration longo e amortização compatível com a curva de ativos.

Imobiliário

Receitas com correção por inflação (aluguel) e CAPEX alto. IPCA+ domina, mas empresas combinam CDI curto para bridge de obra.

Consumo e varejo

Giro rápido, margem apertada e estoque sensível a juros. CDI é a régua do giro; prefixado pode ser tático em viradas de ciclo.

Agronegócio e exportadores

Receita dolarizada: atenção ao câmbio. Empréstimos atrelados a USD requerem hedge; IPCA pode ser secundário no fluxo.

Serviços B2B

Contratos de longo prazo com reajuste anual por IPCA e SLAs. Dívidas IPCA+ casam melhor, com CDI curto para capital de giro de projetos.

FAQ (perguntas frequentes)

CDI e SELIC são a mesma coisa?

Não, mas andam juntos. SELIC é a taxa básica decidida pelo COPOM; CDI é a taxa efetiva entre bancos. Para o gestor, a diferença prática é pequena no dia a dia, mas existe.

O que é melhor: CDI, IPCA+ ou prefixado?

Nenhum “ganha” sempre. Depende do prazo, do fluxo de receita e da sua visão de juros e inflação. Use carteiras híbridas e simulações de cenário.

Por que IPCA+ pode sair mais caro que CDI?

Porque o IPCA previsto pode surpreender para cima e o spread IPCA+ pode ser alto. Em desinflação, IPCA+ costuma ser vantajoso — mas não é regra.

Vale migrar dívida CDI para IPCA+ quando a inflação cai?

Possivelmente, se sua receita for indexada e se os prêmios IPCA+ estiverem atrativos. Simule CET em diferentes cenários antes de renegociar.

Como reduzir o custo de capital agora?

Negocie spread com base em governança e garantias, alongue prazos onde houver previsibilidade, e use mercado de capitais quando fizer sentido — sempre comparando CET.

Conclusão: o índice não é o herói — o seu fluxo é

SELIC, CDI e IPCA são engrenagens da mesma máquina. O acerto está em escolher a combinação que minimiza o CET sem criar riscos de caixa e que “conversa” com a forma como sua receita e seus custos evoluem no tempo. Para 2026, a tese vencedora é disciplina: simular, diversificar indexadores, casar prazos e deixar a governança de crédito abrir portas de funding mais baratas.

💠 Comparar CET: CDI vs. IPCA+ vs. prefixado📊 Simular debêntures/NP/LC (indexador + spread)🏗 Explorar linhas BNDES (prazo e carência)

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Vinicius Teixeira Vinicius Teixeira é especialista com mais de 15 anos de experiência no mercado financeiro, atuando com foco em soluções estratégicas para câmbio, crédito estruturado e inteligência financeira para empresas. Ao longo da carreira, ajudou centenas de negócios a tomarem decisões mais inteligentes e rentáveis, sempre com uma abordagem analítica, consultiva e baseada em dados. Fundador da GX Capital, Vinicius combina sua vivência de mercado com o uso de tecnologias avançadas e inteligência artificial para oferecer uma nova geração de serviços financeiros. É também palestrante, tendo participado de eventos e formações voltadas à educação financeira e à transformação digital no setor. No portal da GX Capital, compartilha sua visão sobre o futuro do mercado, tendências econômicas e estratégias práticas para empresas que querem crescer com eficiência e segurança.